Um Mestre Para Você

Por muitos anos, eu tenho estudado e pesquisado sobre a possibilidade da criação de um Mestre para nós mesmos por meio da capacidade ilimitada do cérebro. Apresento agora as minhas conclusões…

Você provavelmente já deve ter passado por várias situações em que não sabia exatamente o que fazer, ou que ficou confuso sobre qual decisão tomar. Mesmo sabendo, talvez, qual seria a melhor opção, sentia a necessidade de ouvir alguém, de fora, que não fosse você mesmo, falando sobre o assunto. Ou seja, você queria uma segunda opinião. De modo semelhante, você também já deve ter se encontrado em várias ocasiões em que um amigo lhe pediu conselhos ou uma sugestão sobre determinado assunto. Isto já o levou, creio eu, a várias vezes pensar sobre o porquê de sermos tão bons em aconselhar os outros e tão confusos em tomarmos as nossas próprias decisões.

A resposta à questão acima parece muito simples mas contém implicações nada desnecessárias… A resposta pra tudo isto é que, quando estamos de fora da situação, podemos observar as coisas com bem mais clareza do que quando estamos envolvidos no caso. Se fôssemos fazer uma comparação, poderíamos dizer que é como se estivéssemos perdidos num labirinto desconhecido e de repente pudéssemos observá-lo do alto. A saída seria mais fácil… Não é assim que funcionam algumas tecnologias de nossos dias, como o Google Earth ou os sistemas de GPS?

Pois bem, eu analisei isto por muitos e muitos anos, de diversos ângulos, em vários contextos, e entre inúmeras pessoas e culturas. Percebi que todas as pessoas, não importa quais, precisam (mesmo que algumas não reconheçam) de um “mestre”, de uma voz exterior, de alguém de fora, para lhe nortear as questões e dar respostas que muitas vezes elas já sabem.

Esta questão de necessidade de um aconselhamento de alguém de fora foi observado em vários ambientes e em épocas totalmente distintas. É o que acontece nas religiões, na psicologia, nos conselheiros governamentais, nas conversas de amigos, etc.

Com isto, passei a formular a possibilidade de alguém desenvolver, de forma não-psicótica, um conselheiro para si mesmo. A psicose só existe quando o indivíduo perde a noção da realidade. Eu demonstrarei que não falo de um procedimento nesta direção…

Mister brooksExemplos de auto-conselheiros que se fazem presentes por meios psicóticos são os que podemos constatar nos portadores de esquizofrenia. Algumas pessoas com esse distúrbio não conseguem diferenciar certos aspectos do que é real e do que é imaginário. Isto faz com que a sua imaginação crie vozes ou até mesmo imagens de pessoas que não existem, e estas vozes ou pessoas interagem com tais indivíduos de uma forma bem realista, fazendo com que os indivíduos portadores do distúrbio até mesmo passem a duvidar daqueles que negam a existência real de tais alucinações. Exemplos de amigos imaginários do tipo psicótico podem ser vistos nos filmes A Beautiful Mind (Uma Mente Brilhante) e Mister Brooks (Instinto Secreto).

Não obstante, voltando ao nosso ponto, será que podemos criar, de forma saudável, sem psicose, um conselheiro pessoal para nós mesmos? As evidências me demonstraram que sim. Eu estudei por anos esta questão.

Para iniciar a explicação do processo, darei como exemplo a história mostrada no filme Náufrago, interpretada pelo ator Tom Hanks. Este filme mostra um funcionário da empresa FedEx (uma espécie de Sedex, no Brasil) que sofre um acidente de avião mas consegue sobreviver por anos numa ilha deserta. Hanks interpreta um ser humano saudável. No entanto, a sua completa ausência de companhia humana na ilha o faz criar uma dupla personalidade, a quem chama de Wilson, e a representa fisicamente numa bola de baseball com um rosto sorridente desenhado com seu próprio sangue. A bola de baseball acaba se tornando um dos principais elementos do filme.

Como é possível criar um Mestre ou um conselheiro para nós mesmos por meio de nossa mente e – mais importante – como fazer isto sem perder o senso da realidade? Outro ponto crucial: qual seria a importância desse conselheiro pessoal? Estas serão as próximas questões.

O psiquiatra Dr. Daniel J. Siegel, já citado por mim há alguns anos atrás, escreveu em seu brilhante livro, O Poder da Visão Mental, interessantes questões relacionadas ao cérebro, aos processos mentais, a sua interação com a personalidade, etc. Este médico explica em seu livro algo que ele chama de “estados mentais” ou os vários “eus” que cada um de nós possui. O que seria isto? Para o doutor D. J. Siegel é importante que tais estados sejam compreendidos e que se promova, pelos indivíduos, uma integração entre todos eles. Mas para o psiquiatra, esta integração não deve ser rígida. Ele diz:

“Um conjunto heterogêneo de estados é completamente normal nos humanos. A chave para o bem-estar é a colaboração entre eles, não alguma unidade rigidamente homogênea. A noção de que podemos ter uma única forma totalmente consistente de ser é, ao mesmo tempo, idealista e pouco saudável. ” (SIEGEL, Daniel J. O Poder Da Visão Mental: O Caminho Para O Bem-Estar. Tradução: Fátima Santos. – Rio de Janeiro: BestSeller, 2012. Página 257).

De acordo com esse experiente e renomado psiquiatra, as pessoas experimentam diferentes “autoestados” durante os diferentes momentos de seu dia-a-dia. Ele explica, por meio de várias demonstrações e conhecimentos neuro, bio e fisiológicos, como o que somos é, na verdade, um conjunto intricado de vários “eus”. Às vezes esses autoestados são completamente subconscientes e autônomos. Ele dá vários exemplos, um dos quais, o de quando vamos jogar tênis (ou outro esporte) . Quando nos encaminhamos para o local, colocamos a roupa, pegamos a raquete e entramos na quadra, o corpo e a mente interagem de um modo específico e único que nos transforma aptos para jogar aquela partida de tênis. O conhecimento das regras, os macetes, os movimentos apropriados, as fraquezas do adversário – tudo isto vem à tona, por meio de vários mecanismos do corpo, e nos separa daqueles nossos outros “eus” : o da empresa, o do romance, o do sexo, o da calma, etc.

Bem, estas considerações do Dr. D. J. Siegel não me surpreendem e nem tampouco me são algo grandioso ou uma novidade… Mas são muito interessantes do meu ponto de vista, em notar que os pesquisadores da psiquiatria, da neurologia e da psicologia também possuem as minhas mesmas, ou semelhantes, observações. Isto me é de grande valor…

Eu passei a pesquisar e catalogar a observação do fenômeno de formação do Mestre para si mesmo em diferentes grupos, culturas e movimentos ideológicos. Ele está subjacente em todos os lugares e grupos.

Os procedimentos de meditação das religiões místicas, de oração das religiões judaico-cristãs, a transformação da pedra bruta em uma pedra polida da Maçonaria, a incorporação de entidades das religiões espíritas e espiritualistas – tudo parece aludir a um mesmo fenômeno: a criação de um novo “eu” para si mesmo. O que estou propondo não é nada diferente ou demasiadamente inovador…

O nosso cérebro é um órgão muito poderoso e potente. É atualmente a mais intrigante forma orgânica de investigação e de pesquisa. A nossa personalidade social não pode ser tudo o que o cérebro e a sua capacidade representam…

O procedimento para a criação de um Mestre para si mesmo não é muito complexo. Visto o nosso cérebro ser muito potente, porém ser viciado em representações simbólicas, eu sugiro que você dê, como primeiro passo para a criação de seu Mestre, um nome a ele. Que seja algo altamente simbólico e representativo. É necessário que seja algo diferente de seu nome, para que se evite uma confusão posterior de que este Mestre não passa de seus pensamentos tentando pensar de uma outra forma.

Não podemos, porém, fugir da realidade. O Mestre não é alguém separado de você. Não estamos falando de um processo psicótico neste texto. O Mestre é, na verdade, o que alguns estudiosos estão chamando de “ipseidade”. A palavra “ipse” vem do latim, e significa “próprio”. Seria o que o senso comum costuma conhecer como “essência”. Esse Mestre existe de algum modo no seu cérebro. Ele conhece todos os seus pensamentos e argumentos, suas virtudes e fraquezas, seus traumas e fetiches… O seu Mestre conhece, além de tudo, este seu “eu social”. A partir de agora, é ao Mestre que você poderá prestar contas, conversar, argumentar, meditar, etc. No início, você se sentirá como que falando com seus próprios sentimentos… Mas com o passar do tempo, com treinamento, e continuando a chamar e diferenciar ao Mestre pelo seu devido nome (que não deve ser mudado), você o verá e sentirá como alguém bem diferente do seu “eu social”. Em alguns momentos, sentirá até mesmo a sua presença amigável. Mas não se perca! O Mestre é – e sempre será – a sua própria essência pessoal, a capacidade de raciocínio lógico mais acurada de seu cérebro, a sua mente cheia de sabedoria.

Crie um Mestre para você mesmo e nunca mais precisará ter dúvidas ou incentivos exteriores novamente…

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FOTO : Cenas do filme Sr. Brooks (Instinto Secreto).

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